Saio mais cedo do escritório
aumentam-me as chances de esperar na fila
tudo o que eu quero desta tarde fria
no ônibus cheio e cansado
que passa pela Freguesia
é ter um lugar sentado
hoje eu vou na janela
seja por bem ou por mal
olhar a noite caindo
enquanto leio o jornal
primeiro os classificados
compro vendo alugo
procuro um rouxinol
os anúncios de emprego distraem o trânsito
emperrado na política nacional
Cruz das Almas está longe
mais perto
o futebol
nas ruas pessoas lojas apitos buzinas e luzes
apressam-me para a família
de onde vejo a cidade viajo lento e contente
desprezo no meu conforto
a sensação que se infiltra
no ônibus por toda parte de pertencer
como os outros
à mesma ruína do dia
escolho na página mappin na jumbo
depois na mesbla
artigos inúteis de oferta
na ponte com a marginal
cresce no banco o vizinho
estica o pescoço
disfarça
reparte comigo o jornal
como fugir às investidas de um chato
talvez com um cutucão
seguido de minhas desculpas
só que o parceiro do lado
é grande forte
encarado
meto o jornal entre as pernas
como é que eu vou me arrumar
sem ter lido as efemérides
tampouco as policiais
gasto na sombra da tarde
a fama da noite no bar
agora já não tem jeito
está escuro demais
as mãos se cruzam no peito
cochilo
pende a cabeça reclina
na coluna dos editoriais